Foi como aluna da Prof. Leilane Mendonça Zavarizi da Rosa no curso Atenção à Saúde da Pessoa Idosa (UFSC, Florianópolis, 2014) que obtive a indicação do livro cujo resumo é objeto desta postagem.
O Estatuto do Idoso – Aspectos Criminológicos e Penais (RITT, 2008) – aborda os
aspectos que influem na avaliação dos avanços ou retrocessos do Estatuto do
Idoso (Lei 10741 de 1º. de outubro de 2003): envelhecimento da população
brasileira; sua prioridade legal; sua vida digna, as responsabilidades dos
administradores públicos e dos operadores jurídicos frente às demandas atuais e
as que virão em decorrência da inversão da pirâmide social no que diz respeito
à idade. Esses importantes temas sobre os direitos dos idosos são apresentados em
seus cinco itens (ou capítulos do livro).
O item 1 – O Idoso frente à violência doméstica e familiar – dimensiona a
realidade de preconceito e violência doméstica e familiar e avalia suas
consequências sociais e culturais. Na população brasileira, o aumento da
proporção de idosos deve-se à diminuição da mortalidade infantil, ao aumento da
expectativa de vida das pessoas e à queda da natalidade. As projeções apontam
para um crescimento do grupo etário com 60 anos e mais de idade. Desta forma, num
futuro próximo, o Brasil será um país de idosos e os administradores públicos
deverão estar aptos a lidar com a realidade social do envelhecimento da população.
A longevidade é considerada como um
objetivo a ser alcançado pelas sociedades ocidentais contemporâneas. No
entanto, é necessário atingir o envelhecimento com autonomia e independência o
que passa a ser um grande complicador para os países onde há grandes
desigualdades sociais. Pois os mesmos ainda não se estruturaram para atender de
forma satisfatória as necessidades básicas da infância e adolescência e já
somam uma grande quantidade de idosos que engrossam a população dos que se
acham fora da produção econômica, mas demandam investimentos no atendimento às
suas necessidades. O Brasil é um dos países onde há grandes desigualdades
sociais. Em meados do século XXI teremos a
inversão da pirâmide social no que diz respeito à idade. Haverá mais idosos do
que jovens habitando nosso país. Desta feita, “tratar, proteger o idoso contra
a violência doméstica e familiar está ligado diretamente ao interesse público
[...]: o de implementar as políticas públicas” (prioritariamente via Conselhos
Municipais) e que incluam programas voltados para a repressão da violência
doméstica e familiar.
O item 2 – Humanismo, direitos humanos e dignidade da pessoa humana – menciona
que a legislação brasileira
estabelece que os poderes públicos devem promover as condições para que a
liberdade e a igualdade dos indivíduos sejam reais e efetivas. Isso depende não
só de uma concepção de Estado justo, mas também de uma gestão pública correta
no sentido de proporcionar uma vida digna a seus cidadãos.
Essa realidade mostra o não atendimento
aos direitos fundamentais da pessoa humana conforme preceitua a constituição
federal brasileira vigente – Estado
Democrático de Direito. Sua criação de ‘fato’ depende dos administradores públicos e dos operadores jurídicos.
No prefácio assinado pela Professora
Pós-doutora em Direito pela Universidade de Burgos Marli Marlene Moraes da
Costa, pode-se ler: “Com muita propriedade os autores referem que no Brasil não
possuímos uma formação humanista de respeito e consideração para com o idoso. O
que fazemos é tratá-los como objetos descartáveis e, o que é pior ainda, em
muitos casos, além de toda a discriminação que sofrem no contexto social, ainda
são vítimas de violência intrafamiliar. Nesse contexto, o Estatuto do Idoso é
um instrumento de proteção aos direitos constitucionais, sendo, porém,
necessário que haja um engajamento de toda a sociedade, a partir do poder local
para criação de uma rede de atendimento e fiscalização no cumprimento dos
direitos contidos nesse Estatuto".
No item 3 – O Brasil como um Estado Democrático de Direito – é feita a
caracterização histórica do Estado, explanando-se sobre sua origem sua
significação e suas transformações. O Estado democrático de Direito é
conceituado, sendo descritas as suas características.
Lê-se no prefácio da obra: “A
Constituição Federal de 1988, ao elencar os
direitos sociais no rol dos Direitos e Garantias Fundamentais, expressou sua
clara opção por um Estado Democrático de Direito, sendo os objetivos constantes
em seu artigo 3º os de construir uma sociedade livre, justa e igualitária,
garantindo o desenvolvimento nacional, erradicando a pobreza e reduzindo as
desigualdades sociais, tendo sempre como norte o fundamento maior da dignidade
da pessoa humana. Porém, sabemos que, no caso específico da população idosa no
Brasil, não basta a mera previsão legal. São necessárias a proteção e a
promoção dos direitos sociais por meio de políticas públicas eficazes, pois os
problemas são reais, estão aí para que todos vejam".
A sociedade deverá prever mecanismos
para atender os idosos com a máxima prioridade
e com respeito a sua dignidade (compreendida sob uma ótica humanista). Isso
implicará em partir da inclusão social para resgatar o olhar dos cidadãos das
diferentes idades sobre a pessoa idosa como valor para a sociedade. A pessoa
idosa deverá manter seu ânimo e seu vigor na velhice, conservando seus
potenciais de aprendizado e de sociabilidade para usufruir do lazer.
O item 4 – O Estatuto do Idoso: o Estado, a sociedade e as políticas públicas na proteção
da dignidade do idoso – discorre sobre a evolução legislativa em relação ao
idoso.
Apresenta histórico sobre a legislação
brasileira referente ao idoso a partir da promulgação da Constituição Federal
de 1988 que prevê a proteção ao idoso em seus artigos 1º. nos incisos I e II,
3º.- no inciso IV, 201, 203 em seu inciso V e 204. O direito do idoso foi
contemplado de uma forma ampla na Lei 8842/94 que descreveu a Política Nacional
do Idoso, propôs a inclusão curricular de geriatria e gerontologia nos cursos
superiores da saúde, previu a criação dos conselhos do idoso (federal, estadual
e municipal). A Lei 8842/94 (regulamentada pelo Decreto Lei 1948/96 e pela
Portaria 1395 de dezembro de 1999) destacou: a reprivatização do cuidado do
idoso ou retorno à família da responsabilidade de cuidá-lo; para o envelhecimento
saudável por meio de investimentos na melhoria da capacidade funcional e da
prevenção de doenças. Como ato consequente houve a criação do Programa de
Assistência aos Portadores de Alzheimer pela Portaria 703 do Gabinete do
Ministro de 16/04/2002 que previu suporte sistematizado aos portadores de
demências e seus familiares.
A Lei 10741/2003 (Estatuto do Idoso) definiu
o princípio da prioridade absoluta como primazia ou preferência que coloca o
idoso à frente das crianças, dos adolescentes e dos adultos. Para assegurar o
merecido espaço na vida social, o Estatuto ordena respeito ao idoso conforme
definido em seu artigo 10: inviolabilidade da integridade física, psíquica e
moral. Abrange a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, de
valores, ideias e crenças, dos espaços e dos objetos pessoais. Para tal, cobra
da família, da comunidade e da sociedade, assim como do poder público, seu
efetivo envolvimento na responsabilidade de assegurar ao idoso a efetivação de
seus direitos (à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao
esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao
respeito e à convivência familiar e comunitária).
O princípio da dignidade da pessoa
humana deve se concretizar por meio de políticas públicas municipais para
proteção do idoso contra a violência doméstica e familiar. É um avanço
legislativo que o Estatuto do Idoso considere a importância da família e do
afeto e se coloque contra o asilamento e o abandono do idoso.
Lê-se no prefácio da obra: “Sendo a
Constituição de 1988 considerada um marco de abertura para um período de
descentralização federativa em que houve um processo de redefinição de
competências e de atribuições, ou seja, em que certas funções de gestão de
políticas foram transferidas do governo federal para os municípios, nada mais
justo do que a sociedade passar a ser coautora no processo de tomada de decisões,
como elemento ativo na formulação de políticas de inclusão social do idoso. O
município, portanto, possui competências exclusivas, cumulativas e, em diversos
casos, a possibilidade do exercício de competência constitucional suplementar.
A problemática da garantia dos direitos sociais dos idosos no Brasil
encontra-se inevitavelmente unida ao tema das estratégias de políticas públicas
e de medidas de sensibilização e educação, medidas no âmbito sanitário, medidas
de seguridade, penais, processuais e judiciais – todas no âmbito da violência
contra o idoso".
O item 5 – O Estatuto do Idoso e a questão penal: principais aspectos – debate
questões polêmicas como a ampliação ou não do conceito de crime de menor
potencial ofensivo e aplicação ou não dos institutos despenalizadores previstos
na Lei n. 9.099/95. Indaga se o Estatuto do Idoso no combate à violência
doméstica e familiar é um retrocesso ou um avanço.
Conclui sobre aquelas questões
polêmicas afirmando que a superação
da discriminação e da violência contra o idoso só será possível se nos
esforçarmos pela conquista de uma igualdade material que supere a mera
igualdade ante a Lei.
O idoso sofre discriminação social em
face do enaltecimento da juventude eterna e da cultura de desrespeito e
desprezo aos direitos da população fragilizada na qual também se insere o
idoso. “O Estatuto do Idoso é um instrumento para garantir os direitos
fundamentais dessa população e para protegê-la contra a violência doméstica".
“É inegável que o Estatuto do Idoso é
um avanço no trato com a questão da chamada Terceira Idade, em especial nas
áreas da saúde, lazer, previdência” O Estatuto do Idoso é “um microssistema
legal de garantias na proteção da dignidade do idoso [...] estabelecendo o
princípio da prioridade absoluta”. Quanto à formulação de políticas públicas o
idoso deverá “ter prioridade orçamentária, como forma de garantir, acima de
tudo, sua dignidade.”. As políticas públicas para os idosos deverão ser
delineadas de acordo com os princípios: participação, independência,
autorrealização e dignidade. Outra importância do Estatuto do Idoso (em
seus artigos 52 a 68) é prever a fiscalização das instituições asilares:
negligência na higiene e noutros cuidados. Se necessário, e observada a
gravidade, as instituições poderão ser penalizadas com suspensão de verbas
públicas, afastamento de dirigentes e interdição.
Os programas para idosos deverão
informar o idoso de seus direitos de cidadão para elevar sua autoestima, assim
como interferir na criação de mecanismos sociais geradores “de aceitação, de
reconhecimento e de proteção”.
Já as disposições do Estatuto do Idoso
sobre as disposições penais e processuais são contraditórias e geram dúvidas,
podendo até prejudicar a repressão da violência o que representa
um retrocesso na busca da proteção do idoso.
Resta agora que a sociedade brasileira
efetive “as normas constitucionais e legais, a fim de que, de fato, possamos
esperar um mundo melhor para todos nós, sem violência e discriminação.”
REFERÊNCIA
RITT, Caroline e RITT, Eduardo. O Estatuto do Idoso – Aspectos Criminológicos e Penais. Florianópolis: Livraria do Advogado. 2008.