quinta-feira, 18 de junho de 2015

Carta de uma professora, numa manhã chuvosa. Edna Domenica Merola.

Olá, alunas,

Semana passada fez sol em pleno inverno... Mas, "quando a esmola é muita o santo desconfia...". 
Espero que esteja tudo bem com vocês que faltaram na aula de hoje, devido às fortes chuvas... Pois, "mais vale perder um minuto na vida do que a vida num minuto.
Espero que tenham aproveitado a manhã chuvosa para um bom e merecido descanso. Afinal, "Deus dá o frio conforme o cobertor!"
Se à tarde quiserem trabalhar um pouquinho, envio, nesta cartinha, parte do que fizemos pela manhã. Afinal, ainda é dia e " A esperança é a última que morre!"

ASSUNTO: O coro falado (usado na escrita de textos para Teatro)

O coro grego funciona como um personagem coletivo, na peça. Faz indagações para provocar reflexão. Expressa a opinião pública, critica valores, reage às atitudes dos personagens como o escritor julga que a audiência iria reagir; impulsiona a emoção, confere movimento, promove quebras que podem marcar uma mudança de rumo na ação. 
O coro é o elo com os rituais religiosos que originaram o Teatro e, portanto, mantém a sua alma coletiva. O que é uma atitude muito sábia, já que, "Cautela e caldo de galinha nunca fez mal a ninguém. "


O QUE ACONTECEU NA AULA:
Ensinei a usar o coro (recurso da Tragédia Grega) na produção de texto para teatro. Obviamente, isso implica em criar pelo menos 2 personagens.
Para eliciar a criação de personagens, usei as minhas já famosas cartas de tarô, à moda do RPG. Se ainda não era aluna do curso, no semestre em que trabalhamos com as cartas, leia, por favor, o contido na postagem "Criação de Personagens", no blog Aquecendo a Escrita, no link: 
http://aquecendoaescrita.blogspot.com/2014/06/criacao-de-personagens-e-rpg-edna.html 

Ainda no aquecimento para a construção de personagens, usei a estratégia do 'ditado popular'. Entenda que o coro é um personagem (coletivo, plural).
Após o sorteio de duas cartas do tarô para cada aluno, expus 56 ditados populares que compilei. Associando as cartas sorteadas aos ditados, seus colegas escolheram os que seguem:


O que os olhos não veem o coração não sente.


A esperança é a última que morre.


Mais vale um pássaro na mão do que dois voando.


Quando a esmola é muita o santo desconfia.

Mais vale perder um minuto na vida do que a vida num minuto.


Cautela e caldo de galinha nunca fez mal a ninguém.


Deus dá o frio conforme o cobertor.



As produções foram muito boas... 
Seus colegas mandam lembranças.


Isto posto, a professora lhes envia esta singela tarefa (Afinal, 
" Mais vale um pássaro na mão do que dois voando"):

Construa um texto para teatro, usando 3 personagens. Dois personagens serão inspirados em cartas do tarô. O terceiro personagem (para ser dito por um grupo de pessoas ou pelo coro) é o que irá interferir, dizendo um ditado popular, quantas vezes a autora  (ou a aluna) achar oportuno. Poderá, também, usar vários ditados, conforme o efeito estético que desejar causar. 

Ah! Já ia me esquecendo... Retiramos as cartas de que não gostamos, antes de iniciar o sorteio... Afinal : "O que os olhos não veem o coração não sente"...

Afinal (e desta vez é para finalizar) ... De chato já tínhamos a chuva e a ausência de vocês!

Com carinho,
a Professora.


ANEXO 1: DITADOS POPULARES
1- Cão que ladra não morde.
2-  A justiça tarda, mas não falha.
3-  Dois bicudos não se beijam.
4- A pressa é inimiga da perfeição.
5-Quem tem boca vai à Roma.
6- Em terra de cego quem tem olho é rei.
7- Quando a esmola é muita o santo desconfia.
8- É de menino que se torce o pepino.
9- Há males que vêm para o bem.
10- O que os olhos não veem o coração não sente.
11- Por fora, bela viola. Por dentro, pão bolorento.
12- Cada macaco no seu galho.
13-  A esperança é a última que morre.
14- Quem não tem cão caça com gato.
15-O apressado como cru.
16- Quem casa quer casa.
17- Devagar se vai longe.
18- Nem tudo que reluz é ouro.
19- Quem sai na chuva é pra se molhar.
20-Mais vale um pássaro na mão do que dois voando.
21- A união faz a força.
22-  Quem conta um conto aumenta um ponto.
23- Nem tudo que balança cai.
24-Quem procura acha.
25- Em casa de ferreiro o espeto é de pau.
26-Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura.
27- É errando que se aprende.
28- Quem ri por último, ri melhor.
29-Para bom entendedor meia palavra basta.
30-Um dia da caça, o outro do caçador. 
31-Quem sabe faz, quem não sabe manda.  
32-Manda quem pode, obedece quem deve.  
33-Não há regra sem exceção. 
34-As aparências enganam. 
35- Para o bom entendedor meia palavra basta 
36-Quando um não quer, dois não brigam. 
37- Com tempo tudo se cura 
38- O homem prevenido vale por dois. 
39- Quem primeiro se queixa foi quem atirou a ameixa 
40- Águas passadas não movem moinho. 
41- Mais vale perder um minuto na vida do que a vida num minuto. 
42- Uma andorinha só não faz, verão. 
43- Quem ama o feio, bonito lhe parece.  
44- Quem procura sempre acha, se não um prego, uma tacha. 
45- A ociosidade é mãe de todos os vícios 
46- Deus dá o frio conforme o cobertor 
47- O saber não ocupa lugar 
48- Tudo que não mata engorda 
49- Cautela e caldo de galinha nunca fez mal a ninguém 
50- Camarão que dorme a onda leva. 
51- Tal pai, tal filho. 
52- Quem dorme com criança acorda molhado 
53- Quem não chora não mama 
54- Laranja na beira de estrada ou é azeda ou tem marimbondo no pé. 
55- Falar é prata, calar é ouro. 
56- As más notícias chegam depressa 

ANEXO 2: CARTAS DO TARÔ (Fonte: Wikipedia)











sexta-feira, 5 de junho de 2015

Ouvir músicas com letras 'intimistas' é indicado para idosos? Edna Domenica Merola

Se você é idoso, pode continuar lendo. Se é fã de Elis Regina também. Se você quer realizar oficinas com músicas para qualquer idade, continue a leitura, sem grandes expectativas (pois desta vez não vou descrever técnicas! Pasme!). Pretendo que essa leitura desperte sua percepção sobre a escolha de letras intimistas, a exemplo das escolhas que Elis Regina fez em momentos diferentes de sua vida. Ao final da leitura, você poderá achar sua resposta sobre as escolhas de músicas com letras que faz no seu cotidiano (Bom trabalho!).

Intimismo ‘zen’ X Intimismo Romântico: 2 escolhas do repertório de Elis Regina

O que chamo de intimismo ‘zen’ exemplifico por uma música de autoria de Gilberto Gil, cantada por Elis. É um verdadeiro exercício de relaxamento.

Gilberto Passos Gil Moreira, mundialmente conhecido como Gilberto Gil, (Salvador, 26 de junho de 1942) é um político, cantor, compositor, multi-instrumentista, escritor, ambientalista, empresário e intelectual brasileiro, também conhecido por sua inovação musical e por ser ganhador de prêmios Grammys, Grammy Latino, galardeado pelo governo francês, com a Ordem Nacional do Mérito (1997), e pela UNESCO como "artista pela paz", em 1999.

O Compositor Me Disse


O compositor me disse que eu cantasse distraidamente
Essa canção
Que eu cantasse como se o vento soprasse pela boca
Vindo do pulmão
E que eu ficasse ao lado pra escutar o vento jogando as palavras
Pelo ar
O compositor me disse que eu cantasse ligada no vento
Sem ligar
Pras coisas que ele quis dizer
Que eu não pensasse em mim nem em você
Que eu cantasse distraidamente como bate o coração
E que eu parasse aqui
Assim

O que chamo de intimismo romântico está em Carta ao Mar de Roberto Menescal e Ronaldo Bôscoli.  A letra faz referência direta ao amor confirmado apesar de “um azul, outra vez, de tarde, morrer” e a aceitação de que a vida seguirá, apesar do desencontro romântico: “segue o mundo [...] sem amar”. 
Elis Regina e Ronaldo Bôscoli foram casados. Antes disso, já tinham tido um relacionamento tumultuado que fora 'aparentemente' interrompido. 

Carta ao Mar




Me multiplicando em sol
Tento uma canção pra você
Trago flores, girassóis
Não me importa mal me querer

O que vai em mim,vem
de um desejo imenso de ser outra vez
Um barco, um azul
Outra vez, de tarde, morrer

Céu sem naves espaciais
Flores, só naturais
Só nós dois e as coisas banais
Mais não, pra quê

Pra que o mundo
Segue o mundo
Sem o mar
Sem amar

De que vale o som sideral
Ou uma rima mais genial
Se o amor está aqui, neste sal
Nesse encontro franco e frontal.

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Páscoa e Reencontro. Edna Domenica Merola

Às vésperas da Páscoa e tantos ovos de chocolate, literalmente sobre a minha cabeça, durante as idas ao supermercado, lembrei-me das comemorações da semana da Páscoa... 
Na minha infância, imaginava que todo o mundo era igual aos moradores do nosso bairro e aos fiéis da Igreja São José do Ipiranga, na cidade de São Paulo. Deve ser por isso que a gente cresce: para nossa alma expandida caber dentro de nós e para podermos abarcar outras experiências diversas das nossas.  
Na quinta-feira, retomava-se o Lava Pés, no qual Jesus se ajoelha para todos os apóstolos inclusive frente ao malvado traidor Judas... Como se não bastasse, o velhinho, doce e bondoso Padre Dante tinha de fazê-lo também frente aos jovens da turma da Legião de Maria que representavam os apóstolos naquelas ocasiões...
Tudo aquilo era muito forte para mim que era uma criança muito religiosa e sensível... E havia a Procissão da Sexta-Feira da Paixão... E tome maus-tratos em Jesus que era de dar pena... E eu sofria com cada chicotada, com cada ferida do Filho de Deus... Mas minha alma de poetisa se deliciava com o cântico da Verônica que podia chegar perto de Cristo e fotografar sua face com o pano sagrado.
Lembro-me da Páscoa de minha infância como uma grande oportunidade de me sentir adulta, acordando antes do sol nascer para ir à procissão da Igreja São José do Ipiranga, na minha amada cidade, quando ainda não era uma megalópole.
Na chamada Procissão do Encontro, podia carregar uma vela acesa durante o longo percurso. O papel de celofane colorido que envolvia a vela era um grande atrativo para mim.  
Nessas ocasiões, minha mãe usava uma mantilha de renda preta e eu uma mantilha de renda branca: linda, lindíssima!  
À época para comungarmos na missa da manhã, deveríamos fazer jejum desde a noite anterior.  
A saída da missa era gloriosa...  
Pois um ovo de Páscoa me esperava, em casa, que ao chegar cheirava café feito em coador de tecido.  
Alguns familiares que não gostavam da procissão e sim de dormir um pouco mais ou de levantar cedo e permanecer em casa para preparar os assados e as massas para o almoço, deixavam a mesa posta para nós que havíamos madrugado.  
Servia-me só de leite... Nem pão, nem manteiga ou bolacha para quebrar o jejum.    
No leite, eu colocava um pedaço bem grande de chocolate que destacava do ovo, tornando a vesti-lo, em seguida, com sua armação de plástico, seu papel laminado e seu papel celofane com desenhos de coelhinhos.                                                      Era uma maneira de recompô-lo e de poder pensar que ainda estava inteiro até a sobremesa do almoço de Páscoa, não me esquecendo de guardar para levar de lanche para a escola na segunda-feira, que era o dia chamado de "Pasquela".   
Alguém de baby doll de nylon e chinelos de cetim bordado com lantejoulas e miçangas, bisbilhotava meu desjejum: 
‒ Puxa, que gulosa, sua carola!  
‒ Olha lá quem fala! Sua turista da missa das dez! 
A carola e a turista cresceram e escolheram lindas profissões: uma a de educadora e a outra de assistente social. Ambas leram Buber e uma amou o Encontro buberiano e outra o pensamento dialógico e a Utopia (mais do que amavam os Beatles e os Roling Stones). Ambas lutaram (como puderam) por um país com menos desigualdades sociais. 
Uma adoeceu com dignidade e foi chamada, relativamente cedo, para ver a face de Cristo no pano sagrado de Verônica e ouvi-la cantar para Ele todo dia (além de participar das rodas de samba celestes, ir aos novos shows da Elis Regina e de Vinícius de Moraes).
A outra permaneceu... Certa de que todo dia pode ser uma oportunidade de organizar uma procissão (ou passeata) pelo encontro. Crente de que em todos os dias pode-se ressurgir, renovando a própria capacidade de expandir-se e de compartilhar alteridade. Ciente de que a grande efeméride nunca é hegemônica e sempre é crítica e reflexiva.   Pois a grande efeméride somos nós... Em humanidade e fraternidade... A efeméride que merece ser comemorada e até ser objeto de tarefa para inocentes criancinhas somos nós: gente de todas as idades, gente plena de pluralidade. Gente que cultiva a esperança de que "amanhã será outro dia... Apesar de você"... Representante instituído que – para mostrar serviço – cria Projeto de Lei que leva seu nome... E propõe mais uma data de caráter hegemônico ou populista. 
Apesar de você, em seu estado de ser tipo brother, a outra envelhece, com serenidade, lembrando-se da mãe de mantilha preta ou com os cabelos ao vento, da irmã assistente social lendo Buber, dos versos de Chico Buarque, dos poemas do João Cabral de Melo Neto, do poder em longo prazo das passeatas pacíficas, do poder pessoal de estar com todos os ideais em dia, da intenção de negar a pedagogia do sofrimento e da exclusão, para firmar votos pela fraternidade, pela empatia e pela compaixão.


MEROLA, Edna Domenica. De que são feitas as Histórias. Postmix. 2014. P. 25-27.

quinta-feira, 5 de março de 2015

Lições sobre Cuidar/Ser Cuidado. Edna Domenica Merola.

Numa interessante oficina para educadores, uma das estratégias utilizadas apresentava um texto e uma imagem diferentes para cada um dos grupos. A tarefa era tecer as possíveis associações entre o texto verbal e o 'imagético'. E, em seguida, cada grupo deveria formular uma questão.
Um dos grupos recebeu uma imagem que alguns de seus membros identificaram como rosas e os demais como tulipas. E um poema de autor desconhecido.
Questionaram o que as flores teriam em comum com a amizade (tema do texto).
Em casa, consultei imagens de tulipas que poderiam ser consideradas semelhantes a rosas. As tulipas em botão, de fato se assemelham àquelas. Vide  http://www.mundodeflores.com/rosas-fotos-tulipas.html


http://www.mundodeflores.com/images/fotos-flores-tulipas.jpg?phpMyAdmin=9ea091c51a5aa3cf876fb3cf0a5f7f3d
No entanto, o cultivo de ambas no hemisfério sul é bem diverso. Rosas se adaptam mais ao nosso clima e seu cultivo acaba sendo considerado algo simples. No nosso território a tulipa é exótica e rara (valores positivos), mas mal adaptada (valor negativo).
Ao pensar na construção de metáforas comparando flores e a amizade, nos deparamos com a questão tanto de seu cultivo como do prazer que nos proporcionam.
Flores raras ou corriqueiras enfeitam, embelezam, perfumam... São bem-vindas, assim como a amizade.
Mas cada laço afetivo que une duas partes demanda algo que vai além da intenção, da afinidade 'gratuita' e da aparência (que se nos apresenta como familiar, honesta, bondosa, agradável, acolhedora, aconchegante...). 
Cada vínculo entre duas pessoas demanda a utilização de energia na construção e na manutenção desse 'estar' que chamamos de amizade... E que nos leva a reconhecer o outro como amigo. 
A princípio é possível ser uma pessoa 'amistosa', ainda que sem amigos. 
Assim como pessoas não 'amistosas' podem ter contatos com várias pessoas que as chamam de amigas. 
Há sempre algum contato que  demanda da outra parte o cuidado intenso como o que pede uma tulipa, e, no entanto, só retribui propocionando uma única florada. Ser professora às vezes pede esse grau de percepção do processo de desabrochar delicado que precisa de temperatura diversa daquela que o grupo é capaz de oferecer em dado momento.
O processo de aprendizagem não implica em cuidados voltados para alterar a natureza dos seres. Implica antes em explicitar o potencial existente nessa natureza de maneira que caminhos de adaptações sejam buscados pelo aprendiz.
A aprendizagem altera antigas percepções sobre o mundo e sobre si mesmo... 

Eis porque como aluna ou como professora, sempre estou envolvida com novas aprendizagens.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Atividade Física e o Idoso: um exercício proposto pela Professora Tânia Bertoldo Benedetti. Edna Domenica Merola

O exercício proposto pela Professora Tânia Benedetti para alunos do Curso de Especialização em Atenção à Pessoa Idosa indicou por fonte a obra Atividade Física e o Idoso: concepção gerontológica. MAZO, LOPES E BENEDETTI (2009). Antes de introduzir a tarefa propriamente dita, apontam-se os itens temáticos abordados no livro referido:
1- "considerações demográficas e epidemiológicas sobre o envelhecimento populacional no Brasil; história dos idosos em diferentes épocas e na sociedade brasileira;
2- história dos idosos em diferentes épocas e na sociedade;
3- mitos, fatos e teorias do envelhecimento;
4- envelhecimento humano: definições e terminologias;
5- aspectos biopsicossociais do envelhecimento humano;
6- doenças mais comuns no envelhecimento;
7- capacidade funcional;
8- Programas de atividades físicas e aptidão física;
9- testes;
10- tipos de atividades físicas (caminhada, natação, hidroginástica, treinamento de força, ginástica, lazer e recreação, jogos e esportes;
11- turismo;
12- nutrição e atividade física.
Na obra Atividade Física e o Idoso,  MAZO; LOPES E BENEDETTI (2009) fundamentam a análise de instrumentos de diagnóstico da capacidade funcional do idoso. A partir da classificação em cinco níveis das atividades da vida diária (AVDs) consideram escolhas de instrumentos de avaliação de habilidades físicas úteis ao diagnóstico da qualidade de vida da pessoa idosa.
O presente exercício apontará o que considera eficaz numa avaliação específica instrumentalizada por escalas, quando se pretende trabalhar as capacidades físicas básicas e necessárias para cada nível.
Considerando que dentro de cada nível de dependência apresentado por idosos o nível de capacidades físicas será diferente, pergunta-se: quais as habilidades físicas que deveriam ser trabalhadas em cada nível a partir da avaliação com os idosos?
A obra Atividade Física e o Idoso, MAZO; LOPES E BENEDETTI (2009) apresenta conceitos para explicar porque a capacidade funcional é um aspecto primordial para a manutenção da autonomia e independência do idoso.
O processo de envelhecimento pode levar a um comprometimento da capacidade funcional (CF). A CF inclui habilidades para executar tarefas diárias de forma independente: deslocamento, autocuidado, preservar as habilidades cognitivas e adequação e integração social por meio de atividades ocupacionais e recreativas, incluindo um sono adequado.
A capacidade funcional existe quando estão ausentes as dificuldades no desempenho de certos gestos e de certas atividades da vida cotidiana.
Atividades básicas instrumentais são: tomar banho, vestir-se, realizar higiene pessoal, mover-se, alimentar-se, controlar esfíncteres, controlar finanças, preparar refeições, tomar remédios, arrumar a casa, fazer compras, usar transporte coletivo, usar telefone e caminhar ‘certa distância’.
A capacidade funcional do idoso depende de certo grau de independência (ou de usar seus próprios meios para realizar algo) e de autonomia (tomar decisões). A independência e a autonomia são fundamentais para manter a qualidade de vida.
A capacidade funcional do idoso poderá ser melhorada mediante trabalho físico orientado por especialista competente. Esse trabalho será equacionado conforme o nível da capacidade do idoso.
É necessário identificar e excluir os indivíduos com contraindicações clínicas para os exercícios. A emissão do atestado médico para consentir que o idoso pratique exercícios físicos deve ser mediante atos como a anamnese e os exames: verificação da pressão arterial, análise do perfil sanguíneo e da função pulmonar. Esses atos deverão redundar na estratificação do risco, ou seja, constituem o pré-teste.
Outro profissional a recorrer é o nutricionista, pois o impacto das atividades e/ou exercícios físicos na saúde depende também dos hábitos alimentares de seus praticantes.
Para selecionar os testes de aptidão física próprios para cada idoso deve-se levar em consideração o nível de AVDs; aplicar os testes para grandes grupos de idosos; utilizar os testes que têm boa reprodutibilidade e validade, além de serem seguros.
Os testes devem ainda representar os principais componentes da aptidão física e da capacidade funcional, conforme os objetivos a que a avaliação se propõe e que serão atendidos pelos componentes que o instrumento abrange.
A seguir, quadro referente aos testes físicos com os critérios supramencionados.

Baterias de Testes Físicos de Idosos no Brasil
Objetivo
Testes
Componentes
Avaliar os elementos da aptidão física e da composição corporal
Fullerton Fitness Test (Rikli Jones, 1999).
Força e resistência de membros Inferiores. Força e resistência de membros superiores. Flexibilidade membros superiores. Flexibilidade membros inferiores. Resistência aeróbia. Agilidade e equilíbrio dinâmico. Composição corporal.
Verificar a aptidão funcional dos idosos
American Alliance for Health, Physical Education, Recreation and Dance – AAHPERD (Osness et al.,1990).
Composição corporal. Flexibilidade, Coordenação.  Agilidade e equilíbrio dinâmico. Força e resistência de membros Superiores. Resistência aeróbia geral e habilidade de andar ‘RAG'.

Consideradas as peculiaridades das avaliações e mensurações das capacidades físicas e funcionais dos idosos, conforme quadro anterior, passa-se para o exercício de demonstração da pertinência de alguns testes para cada um dos níveis de Atividades da Vida Diária alcançados pelos idosos.

Níveis de Atividades da Vida Diária e Testes sugeridos para Avaliação Multidimensional do Idoso
Níveis
Testes Sugeridos
I- 1. Fisicamente incapazes.
2. Fisicamente dependentes.
Escala de Avaliação Clínica da demência CDR (entrevista com o cuidador). Escala de Depressão Geriátrica – GDS 15.  Escala de Avaliação Clínica da demência‒ CDR. Mini Mental.  MOCA.
II- Fisicamente frágeis
Rikli & Jones.
III- Fisicamente independentes
Versão brasileira do American Alliance for Health, Physical Education, Recreation and Dance – AAHPERD:  Zago (2002), Zago e Gobbi (2003), Benedetti et al. (2007), Benedetti et al. (2008) e Mazo et al. (2008). IPAQ ‒ Questionário Internacional de Atividade Física.
IV-Fisicamente condicionados ou ativos
Teste de Uma Milha.
V- Elite física ou Atletas
Testes específicos para atletas.

A diminuição da força leva à limitação funcional, causando a incapacidade e a dependência. Os fisicamente incapazes são aqueles que não realizam nenhuma Atividade da Vida Diária e têm dependência total de terceiros. Não são realizados testes físicos para os acamados.
Entrevistas com o cuidador são importantes para embasar a intervenção do fisioterapeuta e do educador físico. Essa intervenção irá tentar melhorar a qualidade dos movimentos disponíveis no repertório do idoso e que podem ajudar na colaboração do paciente com o cuidador nas tarefas de higienização, de alimentação e no contato afetivo.
Na sondagem das possibilidades de reabilitação, a parceria com o médico é interessante para investigar se há quadro de depressão que causa a situação, assim como ‘reações’ medicamentosas. Esgotadas as estratégias de reabilitação, o fisioterapeuta exerce, ainda, importante papel na assistência ao paciente terminal, em especial quanto às garantias do direito à morte digna.
Os fisicamente dependentes são aqueles que apresentam dificuldade em realizar algumas atividades básicas da vida diária como: caminhar, tomar banho, alimentar-se e transferir-se de um lugar para outro. Eles necessitam de cuidados de terceiros.
É necessário que o médico e o psicólogo investiguem depressão e demências nesse nível de idosos. A avaliação dos fisicamente dependentes a ser feita pelo psicólogo clínico ou o médico psiquiatra incluirá entrevistas com o cuidador. A Escala de Avaliação Clínica da demência CDR (na qual as questões são feitas para o cuidador) poderá ser aplicada.
Aos fisicamente dependentes aplica-se a Escala de Depressão Geriátrica – GDS 15 e o Mini Mental. O Montreal Cognitive Assessment (MOCA) em sua versão experimental brasileira pode ser útil à medida que avalia a capacidade visuoespacial e executiva, a nomeação, a memória, a atenção, a linguagem, a abstração, a evocação tardia e a orientação.  
Descartadas as hipóteses de depressão ou de estágios iniciais de demências, e descartada também a hipótese de efeitos medicamentosos indesejados que algumas vezes são causados pela prescrição em cascata de remédios, o trabalho do profissional de educação física terá bons resultados nos programadas de reabilitação que tenham por objetivo melhorar as atividades básicas da vida diária.
As atividades de autocuidados demandam desenvolver a força muscular (pernas, braços, mãos, dedos, quadril e tronco), flexibilidade (ombros, quadril, joelho, punhos, tornozelos e pés) e agilidade/mobilidade (mãos). Para essas atividades torna-se importante aplicar questionários que mensuram as AVDs e aplicar testes que avaliam as capacidades físicas da força (braço, perna, mão), função manual, flexibilidade (amplitude articular) e agilidade/ mobilidade (pequenos deslocamentos).
Os fisicamente frágeis normalmente estão debilitados. Conseguem realizar as tarefas domésticas leves, como preparar os alimentos, fazer compras, realizar todas as atividades básicas da vida diária e algumas intermediárias.
O trabalho do profissional de educação física terá bons resultados nos programas para idosos fisicamente frágeis que tenham por objetivo melhorar as funções das atividades básicas e intermediárias da vida diária: limpar a casa, cozinhar, fazer compras, sair de casa. Manter boa postura para ter marcha adequada, desenvolver a força muscular, flexibilidade, agilidade (mãos) e o equilíbrio. Os testes a serem utilizados são os que avaliam as atividades básicas e intermediárias da vida diária, e que contemplam as capacidades físicas de força (grandes agrupamentos musculares), flexibilidade, equilíbrio e agilidade/mobilidade.
Sugere-se a escala Rikli & Jones para avaliar idosos fisicamente frágeis. Tendo por objetivo avaliar os elementos da aptidão física e composição corporal, o Fullerton Fitness Test (Rikli Jones, 1999) tem por componentes: força e resistência de membros inferiores, força e resistência de membros superiores, flexibilidade dos membros superiores, flexibilidade dos membros inferiores, resistência aeróbia, agilidade e equilíbrio dinâmico, composição corporal. A aplicação segue a sequência: 1- levantar e sentar na cadeira. Mede a força dos membros inferiores. 2- flexão do antebraço, usando halteres de mão (2,3 kg para mulheres e 3,6 para homens). Mede a força dos membros superiores. 3- sentado e um perna estendida com o calcanhar no chão, a cabeça alinhada com a coluna, tentar tocar o pé com a ponta dos dedos médios. Mede a capacidade da articulação coxo femural e flexibilidade dos membros. 4-  Sentado, caminhar 2,44 m e voltar a sentar. 5- Alcançar atrás das costas. Mede a flexibilidade dos membros superiores.
Dentre os idosos não dependentes estão incluídos os que mantêm um estilo de vida aparentemente ativo, mas que não realizam exercícios físicos regulares. Para esses idosos pode-se aplicar o IPAQ ‒ Questionário Internacional de Atividade Física ‒ cujas perguntas estão relacionadas ao tempo que o entrevistado gasta fazendo atividade física em uma semana normal /habitual. As respostas são dadas levando-se em conta que as atividades físicas vigorosas são aquelas que precisam de um grande esforço físico e que fazem respirar muito mais forte que o normal. E que as atividades físicas moderadas são aquelas que precisam de algum esforço físico e que fazem respirar um pouco mais forte que o normal.
A Seção 1 ‒ Atividade Física no Trabalho ‒ inclui as atividades que o entrevistado faz no trabalho remunerado ou voluntário, e as atividades na universidade, faculdade ou escola (trabalho intelectual).  Não inclui tarefas domésticas, pois serão incluídas na seção 3.
As questões da Seção 2 ‒ Atividade Física como Meio de Transporte ‒ se referem à forma normal como o entrevistado  se desloca de um lugar para outro, incluindo grupo de convivência/ idosos, igreja, supermercado trabalho, escola, cinema, lojas e outros.
A Seção 3 – Atividade Física em Casa ou Apartamento: Trabalho, Tarefas Domésticas e Cuidar da Família ‒ inclui as atividades físicas que o entrevistado faz em uma semana normal/habitual  dentro e ao redor da sua casa ou apartamento. Por exemplo: trabalho doméstico, cuidar do jardim, cuidar do quintal, trabalho de manutenção da casa, e para cuidar da sua família. Inclui somente atividades físicas com duração de pelo menos 10 minutos contínuos.
A Seção 4 ‒ Atividades Físicas de Recreação, Esporte, Exercício e de Lazer ‒ se refere às atividades físicas que o entrevistado faz em uma semana normal/habitual unicamente por recreação, esporte, exercício ou lazer que o entrevistado faz por pelo menos 10 minutos contínuos. Não inclui atividades citadas anteriormente.
A Seção 5 ‒ Tempo Gasto Sentado ‒ inclui questões sobre o tempo que o entrevistado permanece sentado em casa, no grupo de convivência/idoso, na visita a amigos e parentes, na igreja, em consultório médico, fazendo trabalhos manuais (crochê, pintura, tricô, bordado, costura) e no trabalho, durante o tempo livre. Isto inclui o tempo sentado, enquanto descansa, visita a amigos e parentes, faz leituras, telefonemas, assiste TV, realiza as refeições. Não inclui o tempo gasto sentando durante o transporte em ônibus, carro, trem e metrô.
O entrevistado será classificado em “ativo” se na análise do questionário IPAQ a soma do tempo de atividades vigorosa e moderada for igual ou superior a 150 minutos semanais.
Será considerado inativo se as atividades vigorosas totalizarem menos de 10 minutos por semana.
O entrevistado será classificado em “pouco ativo”, se a soma do tempo de atividades vigorosas e moderadas for inferior a 150 minutos semanais.
Os idosos fisicamente independentes realizam todas as atividades básicas e intermediárias da vida diária. Executam trabalhos físicos leves, cuidam da casa, realizam as atividades de que mais gostam e que exigem pouco gasto energético (trabalhos manuais, grupos de convivência, caminhadas, jardinagem, danças, viagens, dirigir automóveis).
É necessário investigar dentre os fisicamente independentes se as atividades da pessoa idosa são suficientes para manter a saúde física e mental. Para que isso ocorra é necessário manter e melhorar as funções físicas que lhes dão independência e previnem as incapacidades ou lesões que podem levar à fragilidade.  Precisam desenvolver a força, resistência muscular e cardiovascular, flexibilidade, equilíbrio, agilidade, coordenação e velocidade de reação. Os testes a serem utilizados são os que avaliam as atividades avançadas da vida diária e as capacidades físicas. Pode-se aplicar o AAHPERD.
Tendo por objetivo verificar a aptidão funcional, o American Alliance for Health, Physical Education, Recreation and Dance – AAHPERD (Osness et al. 1990) é útil para avaliar: composição corporal, flexibilidade, coordenação,  agilidade e equilíbrio dinâmico, força e resistência de membros superiores e resistência aeróbia.
A versão brasileira do AAHPERD aplica-se para mulheres idosas e para homens apenas entre 60 e 69 anos, pois para as faixas masculinas mais longevas ainda não há estudos brasileiros que contemplem os valores normativos necessários.  Os estudos de  Zago (2002), Zago e Gobbi (2003), Benedetti et al. (2007), Benedetti et al. (2008) e Mazo et al. (2008) desenvolveram  o RAG, no Brasil, que mensura Resistência aeróbia geral e habilidade de andar.
Os idosos fisicamente condicionados ou ativos realizam trabalho físico moderado, esportes de resistência e jogos. São capazes de fazer todas as atividades avançadas da vida diária e a maioria das atividades de que mais gostam. Têm aparência física mais jovem em relação às demais pessoas de sua idade. Os testes a serem utilizados são os que avaliam as diferentes capacidades físicas.
O teste de 800 metros proposto por Osness, et al. (1990) é com frequência, utilizado para idosos ativos. O objetivo é medir o tempo que o indivíduo leva para percorrer a distância pré-determinada de 800 metros. A média do tempo de execução pelos idosos é de 5 a 14 minutos e 30 segundos.
Para idosos ativos aplica-se ainda o teste de 1 milha que consiste em caminhar 1.609 metros, no menor tempo possível.
O idoso atleta será avaliado por meio de testes específicos para as diferentes modalidades de atletismo, seu avaliador deverá pedir atestado médico emitido recentemente.
Os esforços dos profissionais que trabalham com idosos deverão reverter em tomada de decisões de forma a atendê-los de forma adequada. Assim, idosos fisicamente incapazes – serão preferencialmente atendidos por fisioterapeuta que terá como objetivo principal manter a massa muscular do paciente. Para idosos fisicamente dependentes aquele profissional terá por objetivo desenvolver força muscular, flexibilidade e agilidade.
Caberá aos profissionais de educação física planejar e avaliar programas de intervenção para idosos: atividades físicas, exercício ou treinamento ‒ devendo dominar o manejo de testes classificatórios que determinem a indicação do idoso para um desses três tipos de intervenção.
Os idosos fisicamente independentes serão assistidos pelo profissional de educação física que trabalhará no sentido de manter e melhorar as funções físicas: força, resistência muscular e resistência aeróbica de seu aluno.
Idosos fisicamente ativos ou aptos serão orientados por profissional de educação física para manter em bom nível a aptidão física e funcional.
Os idosos atletas deverão ser acompanhados por profissional de educação física que dirigirá seu treino.      Pelo exposto no presente texto pode-se concluir que algumas baterias são consideradas adequadas para a mensuração da aptidão funcional de idosos, no Brasil, a saber: Versão brasileira do American Alliance for Health, Physical Education, Recreation and Dance – AAHPERD:  Zago (2002), Zago e Gobbi (2003), Benedetti et al. (2007), Benedetti et al. (2008) e Mazo et al. (2008); bateria de testes de aptidão funcional de idosos Senior fitness Test (SFT) – (RIKLI e JONES, 2001) e o questionário de Atividade Física adaptado para idosos (IPAQ).
Conclui-se ainda que seja importante analisar os objetivos e os componentes dos instrumentos disponíveis para mensurar a capacidade física de idosos. Essas informações levam a refletir sobre a delimitação dos papeis dos diferentes profissionais (psicólogo, médico, fisioterapeuta e o profissional de educação física) e sobre as implicações éticas decorrentes do exercício desses papeis que envolvem a atenção e o cuidado da pessoa idosa.
A realização do presente exercício propiciou a elaboração de algumas sínteses necessárias em relação às várias disciplinas do Curso de Especialização em Atenção à Saúde da Pessoa Idosa, em especial à compreensão de que os referidos estudos são interdisciplinares. Só tal aprofundamento téorico é que poderá alavancar a construção de uma prática de equipe que se pretenda multidisciplinar.


REFERÊNCIAS

MAZO, Giovana Zarpellon; LOPES, Marize Amorim; BENEDETTI, Tânia Bertoldo. Atividade física e o idoso: Concepção Gerontológica. Porto Alegre: Sulina. 2009. 3ª edição. Cap. 8 e 9.

MORAES. Edgar Nunes de. Processo de Envelhecimento e bases da avaliação multidimensional do idoso. In: Envelhecimento e saúde da pessoa Idosa. Fiocruz. 2008. http://www5.ensp.fiocruz.br/biblioteca/dados/txt_215591311.pdf.